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À Caça de Litígios: como os Aplicativos Abutres impactam o Setor Aéreo brasileiro


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12 de outubro 2023

Autora: Camila Faria

No dia 20 de setembro, o Instituto Brasileiro de Aviação divulgou o Anuário da Aviação Civil 2023 apresentando dados significativos sobre a recuperação do setor aéreo após a pandemia. As perspectivas para o ano de 2024 são favoráveis para o setor, porém, um elemento digno de atenção, que influencia negativamente essa expectativa de retomada e progresso, é a problemática da judicialização predatória.

Antônio Augusto Do Poço Pereira, Presidente do Sindicato Nacional das Empresas Aeroviárias (SNEA) e Diretor Administrativo, Financeiro e de Conformidade da ABEAR, ressalta que o excesso de litígios judiciais na aviação comercial brasileira representa um dos principais obstáculos para o estabelecimento de um ciclo positivo de desenvolvimento e crescimento no setor aéreo. “A incidência de judicialização no Brasil é alarmante, chegando a gerar R$1 bilhão de custos anuais para as empresas aéreas segundo levantamento da ANAC. Os dados sobre o excesso de judicialização na aviação comercial brasileira mostram a importância e a urgente necessidade do combate a essa prática”.

Além disso, o Presidente da SNEA destaca que esse crescimento está relacionado às startups que impulsionam suas atividades através das redes sociais e sites para captar demandas de consumidores supostamente lesados por diversas questões, como atraso no voo, alterações ou cancelamentos. “Grande parte do crescimento da judicialização se deve a dezenas de empresas, conhecidas no setor aéreo como “sites abutres”, muitas delas com sede em paraísos fiscais. Aproveitando-se de lacunas da legislação brasileira, inflacionam custos e o número de processos ao fazer crescer, injustificadamente, o número de causas judiciais junto à aviação brasileira, afastando os consumidores dos canais diretos de atendimentos aos clientes das companhias aéreas e de plataformas de mediação do Governo Federal, como o consumidor.gov, que meios mais seguros e rápidos de resolução de problemas”.

A problemática da judicialização predatória afeta variadas empresas no Brasil, contudo, merece especial atenção quando analisamos o setor aéreo, devido à proliferação de plataformas digitais conhecidas como “Aplicativos abutres”, as quais foram desenvolvidas com a finalidade exclusiva de atrair esse público específico.

Por meio de promessas exageradas, tais plataformas possuem o objetivo principal de captar clientela para seus advogados parceiros, os quais buscam o Judiciário a fim de obter vantagens indevidas, por meio de acordos ou procedências dos pedidos.

Conforme dados da Corregedoria Nacional da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), entre 2020 e 2022, 65 aplicativos encontravam-se ativos. Destes, aproximadamente 37 foram proibidos de continuar suas operações por decisões emanadas do judiciário.

Um estudo conduzido pelo escritório de advocacia Mascarenhas Barbosa Advogados sobre o tema indica que atualmente (2023) existem 49 plataformas digitais em operação.

Ainda, de acordo com a Associação Internacional de Transportes Aéreos, 98,5% das ações cíveis do mundo estão concentradas no Brasil. Além disso, no país, ocorrem oito processos judiciais a cada 100 voos.

Em contraste com esses números alarmantes, o balanço da Anac do ano de 2022 revela que as companhias aéreas brasileiras alcançaram uma impressionante regularidade de 97% nos voos, o mesmo índice registrado nos Estados Unidos, por exemplo. Além disso, a pontualidade nas partidas entre as companhias nacionais atingiu 85%, superando as norte-americanas, que registraram 79% de pontualidade. Esses dados enfatizam os desafios representados pela atuação dos aplicativos abutres no setor aéreo.

E mais do que violar a classe do Poder Judiciário, muitos desses aplicativos ferem os próprios direitos dos consumidores quando, por exemplo, realizam a cessão de crédito de direito personalíssimo (dano moral).

Em breve consulta ao site do reclameaqui é possível observar tal violação. São diversos relatos de consumidores que se sentiram lesados pelos aplicativos abutres. Até mesmo ações judiciais são distribuídas por esses consumidores em face das plataformas na tentativa de reaver valores.

Em face dos desafios impostos pela judicialização predatória no setor aéreo, torna-se evidente a necessidade de ações coordenadas para mitigar esse fenômeno prejudicial. As perspectivas positivas para o ano de 2024 no setor aéreo são, de fato, comprometidas pela proliferação de “Aplicativos abutres” e suas práticas questionáveis.

De acordo com Antônio Augusto, Presidente do SNEA e Diretor da ABEAR, estão sendo implementadas ações e parcerias com o objetivo de mitigar os impactos dessa situação.

Recentemente, no mês de maio deste ano, o Tribunal de Justiça de São Paulo e a ABEAR estabeleceram um Termo de Cooperação Técnica, marcando o início a um projeto-piloto de mediação online para resolução de conflitos relacionados a passageiros. Ainda, uma iniciativa inovadora surgiu a partir da colaboração entre a Associação dos Magistrados Brasileiros (AMB) e as companhias aéreas, com o propósito de conduzir um estudo inédito que visa a analisar a excessiva judicialização no setor aéreo.

Também é relevante destacar a afetação do Tema 1.198, dada a grande quantidade de demandas similares. O Ministro do Superior Tribunal de Justiça (STJ), Moura Ribeiro, relator do recurso que será julgado como repetitivo, convocou uma audiência pública marcada para o dia 4 de outubro com a finalidade de discutir o Tema 1.198. A controvérsia que envolve este tema está relacionada à “capacidade de o juiz, ao detectar indícios de litigância predatória, solicitar à parte autora a revisão da petição inicial, incluindo a incorporação de documentos que forneçam um respaldo mínimo para as alegações apresentadas em juízo. Isso inclui uma procuração atualizada, comprovação de situação de pobreza, endereço e cópias do contrato e dos extratos bancários”.

Portanto, a busca por soluções eficazes para enfrentar a judicialização predatória no setor aéreo deve ser uma prioridade. Isso envolve não apenas a atuação das autoridades reguladoras e do Poder Judiciário, mas também a conscientização dos consumidores sobre seus direitos e a importância de buscar meios adequados de resolução de conflitos. Somente com esforços conjuntos poderemos garantir um ambiente mais equilibrado e justo para as empresas aéreas e os passageiros no Brasil.

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